Existe uma grande diferença entre como algumas pessoas queriam que as coisas fossem e como elas realmente são. A proibição dos cassinos e dos jogos de azar no Brasil é apenas mais um exemplo desse fato.
Proibidos desde 1946 pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra, que usou como motivação um moralismo duvidoso ao ressaltar o moralismo brasileiro: “conflito com a tradição moral, jurídica e religiosa do país”. Como sabemos, a moral brasileira vem deixando a desejar há alguns séculos…
Mesmo com a proibição quase secular, o jogo continuou ocorrendo no Brasil. Além da loteria federal (por algum motivo, tratada como se não fosse jogo), jogos como o famoso Jogo do Bicho, bingos e cassinos ilegais, Poker e corrida de cavalos sempre ocorreram, portanto, proibir o jogo por uma questão moral e “proibir por proibir” podem ser enquadrados como hipocrisia. Em meu ponto de vista, chega a ser cômico.
Trago essa discussão devido à recente especulação de que a pauta está pronta para entrar em debate na câmara dos deputados. Segundo o próprio site da câmara: *Está pronta para entrar na pauta do Plenário a proposta que cria o Sistema Nacional de Jogos e Apostas, legalizando cassinos, bingos, jogos de azar on-line, corridas de cavalos e o jogo do bicho (PL 442/91).*
A partir disso, vou comentar os 2 principais argumentos contrários e favoráveis aos
jogos de azar:
Pontos positivos
Crescimento da Renda, do Emprego e da Riqueza
Tem sentido lógico imaginar que o surgimento de um novo setor gere crescimento do emprego e da renda, independente se forem jogos de azar ou padarias.
Porém, é interessante acompanhar esse resultado no longo prazo. Foi isso que o acadêmico Adam Scavette pesquisou ao analisar 15 anos de bases de dados de Atlantic City logo após a legalização dos cassinos na cidade. Ele encontrou impactos significativos no emprego e nos salários durante os 15 anos e elevação dos preços dos imóveis no prazo de 5 anos após a legalização.
Aumento da Arrecadação de Impostos
Atualmente, é possível ter uma plataforma de jogos operacionalizando no Brasil desde que ela não seja brasileira, o que não faz nenhum sentido do ponto de vista econômico. Francis Markhan, um especialista no tema, definiu o termo “Complexo Industria-Estado do Jogo”, onde o estado e a empresa se beneficiam ao permitirem a expansão do setor. Estima-se que o estado brasileiro arrecadaria R$22 bilhões com a legalização, basicamente 15% do valor do Bolsa-Família anual.
Pontos negativos
Vício e Perdas Financeiras
A preocupação é legítima, porém a proibição apenas encobre esse tema e não o resolve. Um viciado, sem tratamento psicológico, seguirá apostando na internet ou em cassinos clandestinos, que acabam sendo mais perigosos. Por outro lado, em um mercado regularizado, como na União Europeia, é possível estabelecer políticas eficazes e com resultados comprovados de prevenção e combate à compulsão.
Lavagem de Dinheiro
Em 2004, Abdullahi Y. Shehu escreveu um artigo influente argumentando que cassinos e jogos de azar não deveriam ser considerados predicados para lavagem de dinheiro e crimes, mas sim, um intermediário como os bancos ou outros meios financeiros, por exemplo.
Nesse caso, ficaria mais claro, regulatoriamente, que atividades ilícitas existem anteriormente a um mercado ilegal de apostas e assim o objetivo seria apenas regular quem está utilizando essa atividade e não a atividade em si.
Concordo com essa visão. Nos dias atuais, ainda mais. Antigamente, as opções para lavagem de dinheiro eram restritas. Os cassinos eram uma das melhores formas de lavar dinheiro. No presente, com o desenvolvimento tecnológico, existem tantas alternativas que seria necessário bloquear a internet como um todo para obter-se qualquer resultado.
Concluindo
Considerando os pontos principais e os dados comentados, não vejo motivos racionais para a proibição dos jogos de azar no Brasil, ainda mais considerando que eles estão atuando em larga escala e com grandes patrocínios na Internet.
Realmente, pode ser colocado como contraponto que eu apresento uma análise enviesada ao comentar os pontos principais. Entretanto, qualquer um que comente de modo 100% imparcial o tema deve admitir que a proibição é no mínimo questionável. Portanto, quando se falta certeza, não faz mais sentido defender uma alternativa que restrinja menos opções?
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Referências
Aqui estão as referências formatadas em ABNT:
1. ESTÚDIO Conjur. Ainda no limbo jurídico, apostas esportivas crescem no Brasil. Conjur, 26 out. 2021. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2021-out-26/estudio-conjur-ainda-limbo-juridico-apostas-esportivas-crescem-brasil/>. Acesso em: 4 ago. 2024.
2. AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS.
3. MARKHAM, Francis; YOUNG, Martin. Big Gambling: The rise of the global industry-state gambling complex.
4. SCAVETTE, Adam. The Economic Impact of a Casino Monopoly: Evidence from Atlantic City.
5. VALOR INVESTE. Quanto a União pode arrecadar com a legalização de cassinos e jogo do bicho. Valor Investe, 20 jun. 2024. .
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