
05 de outubro de 1988. As chuvas da manhã marcavam o fim da seca na capital federal, que durava longos 4 meses. Não ironicamente, outra importante mudança estaria reservada para aquele dia: Às 15h50, passava a valer uma nova Constituição no Brasil, sepultando definitivamente o autoritarismo outrora presenciado durante o período militar. Passados mais de 30 anos desde sua promulgação, o que temos a comemorar?
Deixe-me contar uma história ainda mais antiga: O ano era 1965; convivemos com diversos ataques à liberdade de expressão – humoristas sendo censurados por decisões judiciais, censura prévia de conteúdo e de qualquer outra manifestação crítica, sob pena de terem seus direitos individuais violados por autoridades do Estado. Ainda, no auge do autoritarismo, deparávamos com uma tentativa do governo em impedir que o cidadão comum exercesse o direito de questionar e expor opiniões críticas sobre os atores políticos. Os veículos de imprensa eram responsabilizados civilmente pela circulação de opiniões consideradas “crime ao Estado de Direito”. Como na distopia de Orwell, o “Ministério da Verdade” teria plenos poderes para interferir no pensamento alheio.
Não há democracia na década de 60. Congressistas eleitos com mais de 300 mil votos perdem seu mandato sem terem respondido ou sido condenados por crime algum. Altera-se o entendimento jurídico à revelia da lei; enquanto o governante máximo segue intocável, mesmo já possuindo condenações reiteradas de corrupção. Pergunto: O que esperar de uma época retrógrada, onde os próprios representantes da justiça, responsáveis por guardar o ordenamento jurídico, afirmam categoricamente que “derrotaram um dos lados em uma eleição?”
Semelhanças não são meras coincidências. Ao leitor atento, fica nítido que esse texto não se trata somente do passado, mas também do presente. O que nos leva a comemorar os direitos conquistados com a Constituição de 88? Como ignorar as diversas violações atuais aos direitos individuais?
Quando vivemos em uma democracia frágil, as letras constitucionais perdem o sentido em meio a interpretações dúbias. São nos sistemas frágeis que juristas e legisladores confundem suas atribuições e transformam-se em aristocratas modernos. Em meio a uma democracia assim, com uma constituição recheada de direitos, nos resignamos ao direito de não ter direito algum.

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