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Intervencionismo Estatal na Economia: a relação entre o risco moral criado pelo Estado e o surgimento de crises econômicas

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Um dos princípios norteadores da ciência econômica baseia-se na seguinte premissa: as pessoas reagem a incentivos. Basicamente, incentivo é aquela força motriz que faz com que indivíduos tomem determinadas atitudes considerando custo e benefício, permitindo-as avaliar qual a melhor maneira de agir frente às transformações e oscilações do mercado. Todo o funcionamento da economia pode ser analisado sob o prisma das ações que são tomadas em virtude dos incentivos que se colocam à frente do público consumidor. O comportamento dos indivíduos sempre será respaldado por um incentivo prévio.

Tomemos como exemplo um aumento no preço do leite. Quando um produto em específico apresenta preços maiores, há um incentivo para que as pessoas deixem de consumi-lo, optando por produtos similares a preços menores, ou optando por consumi-lo em menor quantidade como forma de poupar seus recursos. Em contrapartida, esse mesmo aumento no preço do leite gera um incentivo para que produtores aumentem sua produção, visto que o consumo caiu exponencialmente.

O mesmo raciocínio pode ser aplicado à seguinte situação: imaginemos que o famigerado Imposto Sobre Grandes Fortunas, previsto na Constituição Federal de 1988, enfim seja regulamentado. Com isso, a renda e patrimônio daqueles que possuem vasto poderio financeiro passa a ser sobretaxada de forma ainda mais predatória, gerando um incentivo para que o detentor do capital aloque seus recursos em países que não possuam legislação tributária tão confiscatória. Há um claro incentivo para que a fuga de capitais e investimentos aumente à medida em que se tribute de forma cada vez mais agressiva a renda e patrimônio daqueles que dispõem de patrimônio robusto.

Não há, portanto, como fugir dessa realidade. As pessoas sempre reagirão a incentivos, motivo pelo qual ignorar esse princípio, principalmente quando se trata de analisar políticas públicas ou demais medidas a serem implementadas pelo ente estatal, pode se traduzir em um verdadeiro desastre. Contudo, ao longo da história e, principalmente, dos últimos anos, o que se pode observar é que este princípio tão fundamental para o bom andamento da economia tem sido negligenciado ao máximo por aqueles que, ao fazê-lo, acabam por provocar, ainda que sem a real intenção inicial, empobrecimento, recessão, inflação, endividamento e agravamento de crises econômicas que destroçam por completo os planos de longo prazo de todos os indivíduos, colocando em risco suas ambições, desejos e penalizando seu próprio futuro.

Tais quadros puderam ser observados em 1929, após o crash da Bolsa de Valores, e mais recentemente na crise de 2008, após o estouro de uma bolha econômica gigantesca que golpeou fortemente a economia americana e mundial. Os duros baques sofridos, seja na década de 20 ou nos tempos atuais, fizeram com que tanto a opinião pública, quanto governantes e a própria população buscassem um culpado para tudo isso. E eis que, como de costume, mais uma vez a culpa recai sobre ele, o maior de todos os males já descobertos pelo homem, o responsável por fomentar o consumismo e conduzir pessoas inocentes à pobreza extrema, aquele que não poupa nem mesmo os mais miseráveis da humilhação e da fome: o capitalismo de livre mercado.

Que atire a primeira pedra quem nunca ouviu os clássicos jargões que atribuem ao sistema capitalista a culpa por todas as adversidades e tempos difíceis pelos quais a humanidade já passou. “A crise é gerada pelo capitalismo”; “é preciso regular o mercado para impedir que o capitalismo se autodestrua”; “o capitalismo fomenta o consumismo, levando as pessoas, principalmente as de baixa renda, a se tornarem cada vez mais pobres”.

É claro que para os austríacos, principalmente, tais afirmativas soam risíveis, visto que por anos vem denunciado que o sistema monetário atual baseado em moeda sem lastro fracassaria futuramente, e que as sistemáticas intervenções governamentais na economia têm como resultado inevitável uma piora no padrão de vida dos indivíduos, visto que políticas intervencionistas tendem a gerar inflação e recessão, que corroem por completo a poupança e planos de longo prazo da população.

Aliás, é justamente isso que vem acontecendo nesse momento: o sistema monetário está se fragilizando de maneira assustadora nos últimos anos e pode ruir a qualquer momento novamente. É uma pena que essas afirmativas falaciosas sobre o sistema capitalista de livre mercado sejam tidas, ainda hoje, como verdade absoluta para um número muito grande de indivíduos. A estratégia do governo de tirar a culpa de seus ombros por desastres econômicos parece continuar inabalável.

A ideia ao longo do tempo foi justamente atribuir a culpa ao capitalismo como forma de justificar ainda mais intervencionismo por parte do ente estatal. Enquanto a população crê que o problema é o mercado desregulamentado, governantes encontram respaldo para interferir ainda mais na política econômica, com a garantia de que não serão considerados culpados caso provoquem, como já fizeram inúmeras vezes, distorções no mercado e crises cada vez mais agudas.

O Estado assistencialista, que nós brasileiros conhecemos (ou deveríamos conhecer) tão bem, calca-se e sustenta-se nessas premissas falsas e mentirosas disseminadas propositalmente contra a economia de livre mercado e o capitalismo laissez-faire. Em nome de uma suposta proteção da população, principalmente a mais carente, o ente estatal prontamente se encarrega de interferir e manipular abusivamente o mercado, por entender que cabe a ele, e somente ele, promover a prosperidade e a geração de riqueza, reduzindo desigualdades e impedindo que as pessoas empobreçam.

Ocorre que, infelizmente, todas as ações intervencionistas do governo na economia parecem ignorar, seja propositalmente ou por pura ingenuidade, o fato de que as pessoas reagem a incentivos. É por isso que, normalmente, as medidas tomadas pelo governo com o intuito de regular a economia, fomentar o crescimento, estimular o enriquecimento da população e impedir um agravamento da pobreza extrema, costumam surtir efeito adverso daquele esperado.

Por mais bem-intencionada que possa ser a tomada de uma medida no sentido de intervir na política econômica, o que se vê na prática é uma piora no quadro econômico no geral e a incidência de crises gravíssimas que acabam por justamente empobrecer indiscriminadamente todas as camadas sociais da população. Do mais rico ao mais pobre, não há quem possa escapar: todos sofrem uma diminuição do seu poder de compra, na sua renda e em seu patrimônio.

A verdade é que o Estado acaba criando, ainda que sem querer, um risco moral sem precedentes em virtude de suas ações intervencionistas ou assistencialistas, que acaba por moldar por completo o comportamento dos indivíduos. Ao ignorar totalmente um dos princípios basilares da economia, estimula e incentiva que as pessoas ajam de forma descompromissada, desregrada, sem qualquer visão de longo prazo, e passem a depender ainda mais de benefícios assistenciais e medidas intervencionistas.

Uma das medidas que melhor ilustram esse cenário pudemos observar em nosso país nos últimos anos. A pretexto de estimular o crescimento econômico, o governo brasileiro não poupou esforços para manter as taxas de juros baixíssimas na marra, além de investir pesado na política expansionista, facilitando indiscriminadamente o acesso ao crédito.

Considerando que os indivíduos reagem a incentivos, nada mais natural que as pessoas passem automaticamente a se utilizar das benesses oferecidas pelo governo. Ao se utilizar dessas benesses, passam a acreditar que se tornaram mais ricas e que seu poder de compra foi elevado, fazendo com que passem a gastar mais do que poupar, visto que, agora, podem proceder à tomada de empréstimos para adquirir bens e serviços que antes lhes eram inalcançáveis. O fato de que se torna possível obter tudo aquilo que era inalcançável da noite para o dia, faz com que não mais se vislumbre qualquer incentivo para poupar e fazer planejamento de longo prazo, provocando a falsa sensação de que os indivíduos se tornaram mais ricos e que seu poder de compra aumentou graças a uma economia estável e próspera.

Eis o risco moral criado pelo Estado: ao manter as taxas de juros a níveis baixos e facilitar o acesso ao crédito, estimula a gastança em detrimento da poupança, fazendo com que os indivíduos, que anteriormente mantinham uma atitude mais prudente e preventiva diante de um cenário econômico visto como incerto, mudem seu comportamento por acreditarem que estão diante de uma situação econômica próspera e que se tornaram mais ricos, agindo de forma negligente e imprudente com suas próprias receitas. Tomam empréstimos negligentemente sem considerar se, futuramente, poderão ressarcir os valores tomados. Pensam unicamente no presente e negligenciam por completo seu futuro.

Sob esse sistema, não há necessidade de produzir mais para ter mais dinheiro na mão e melhorar de vida. Basta recorrer ao crédito fácil quantas vezes for necessário. Todos passam a agir como se existisse uma fonte inesgotável de dinheiro, onde as pessoas magicamente passam a usufruir de melhor padrão de vida sem, contudo, produzir mais e acumular riqueza de fato. A visão de longo prazo se estreita enquanto que a visão de curto prazo é fomentada, incentivando as pessoas a consumirem desenfreadamente em vez de poupar. Isso as leva a viver muito além de sua real condição financeira e o desejo por consumir, que antes era controlado com muita cautela, se fortalece e aumenta a cada novo bem e serviço adquirido.

Acontece que, por óbvio, a melhora que os indivíduos observam é puramente artificial. Não houve aumento de riqueza, visto que não houve qualquer acúmulo de capital e maior produção de bens e serviços. Ninguém obteve um aumento real em suas receitas e em seu poder aquisitivo. As pessoas foram simplesmente iludidas por uma falsa sensação de riqueza, um falso sentimento de que seu padrão de vida aumentou, quando, na verdade, acabaram por gastar aquilo que elas não tinham. Desfrutaram de melhorias que, infelizmente, eram puramente ilusórias. Foram estimuladas a agir de forma imprudente economicamente, pois sabiam que poderiam recorrer à tomada de crédito em um cenário de taxas de juros baixíssimas mantidas artificialmente. Em suma: foram vítimas da distorção econômica criada pelo governo, fator que contribuiu diretamente para o empobrecimento geral da população.

É seguro dizer que o governo, ao manipular as taxas de juros e promover políticas expansionistas por meio da impressão de dinheiro, age de forma criminosa, imoral e covarde. Por meio dessas medidas, engana pessoas inocentes que, depois de passado o período de ilusória bonança, se deparam com endividamentos decorrentes da tomada de crédito ilimitado que não poderão cobrir, e com uma inflação galopante, resultante da impressão de dinheiro descontrolada para garantir os empréstimos, que corrói por completo o poder de compra elevado que pensavam ter, fazendo com que, logicamente, o padrão de vida que vinha sendo usufruído anteriormente tenha uma queda abrupta e dolorosa. Em outras palavras: o governo lhe dá uma mão e, passado algum tempo, lhe apunhala com a outra, deixando-o em situação financeira pior daquela que você usufruía anteriormente à política expansionista adotada.

A própria inflação, inclusive, surge como mais um desincentivo à poupança. Considerando que seu poder de compra diminui drasticamente e de forma cada vez mais acelerada, poupar deixa de ser visto como algo vantajoso. O estímulo para a gastança mais uma vez encontra-se fortalecido, acabando por completo com qualquer reserva de capital acumulada ao longo dos anos.

A verdade é que tudo não passou de ilusão. E a realidade, cedo ou tarde, bate à porta. A conta chegou e mergulhou o Brasil na pior recessão já vista na história do país. Privilegiou-se uma visão de curtíssimo prazo, onde as pessoas foram levadas a acreditar que é possível viver somente de fartura sem precisar trabalhar mais por isso, em detrimento de uma visão de longo prazo, baseada na poupança, no acúmulo de capital e aumento de produtividade, bases do sistema capitalista.

Parece ter ficado bem claro que consumismo em nada se relaciona com capitalismo. Capitalismo não fomenta consumismo desenfreado, visto que seu alicerce se encontra justamente no acúmulo de riqueza, o qual só se torna possível através de maior produtividade e poupança. Nesse sentido, o comportamento econômico imprudente não se origina da economia de mercado e do sistema capitalista, mas sim das constantes e sistemáticas intervenções do governo na economia, que distorcem por completo a realidade econômica e induzem a população a inconscientemente acreditar que se tornaram mais ricas do dia para a noite.

Em que pese a análise do risco moral apresentado ter sido puramente financeira, ressalta-se que essa mesma lógica pode ser utilizada com relação ao estado assistencialista. O conceito de Estado de Bem-Estar Social tem sua base nesse princípio: fazer com que um número cada vez maior de indivíduos se torne dependente das ações governamentais, dando margem e justificativa para intervenções ainda maiores tanto em âmbito econômico quanto social. Cada indivíduo passa a nutrir a ideia de que se pode agir de forma negligente e desregrada, diluindo por completo seu senso de responsabilidade individual, visto que se pode recorrer ao assistencialismo e proteção estatal sempre que se age de forma imprudente, tanto em âmbito econômico quanto social.

Desse modo, torna-se incrivelmente atrativo depender mais do Estado, o que faz com que as pessoas deixem de ter incentivo para serem produtivas, impactando diretamente a atividade econômica. A tendência é que o número de indivíduos improdutivos passe a aumentar progressivamente à medida em que os benefícios assistenciais e políticas intervencionistas se expandam. O incentivo para que as pessoas sejam responsáveis com suas próprias economias e produzam mais caso desejem usufruir de um melhor padrão de vida não mais existe. Há apenas o incentivo para continuar dependendo de programas governamentais, visto que para deles usufruir não é preciso ser mais produtivo ou responsável. O governo premia sua irresponsabilidade e falta de compromisso, incentivando-o a continuar agindo como tal.

Simplesmente nenhum resultado positivo pode advir quando esses comportamentos se tornam a base do sistema econômico e político. Ao contrário do que prega a doutrina keynesiana (amplamente defendida por economistas brasileiros, vale lembrar), crescimento econômico não resulta de elevados níveis de consumo. Tal pensamento carece, inclusive, de lógica: para que haja consumo, é necessário que bens e serviços tenham sido produzidos anteriormente. Para que se produza bens e serviços de qualidade, é indispensável que haja acúmulo de capital. Para que se acumule capital, é preciso haver poupança em detrimento de gastos.

Por isso, fomentar o consumo irresponsável como meio para se atingir prosperidade econômica é um verdadeiro desastre. A conta não fecha. Mais pessoas consumindo significa menos pessoas poupando, o que impossibilita o acúmulo de capital para a produção de bens e serviços de qualidade. No final das contas, é justamente o consumo que será afetado, visto que haverá redução na produção e, consequentemente, menos bens e serviços disponíveis à disposição da população, além de uma inflação monstruosa pronta para abocanhar boa parte do seu poder aquisitivo. Fomentar o consumo acaba por, paradoxalmente, desestimulá-lo por um longo período de tempo – ao menos até que a economia volte para os trilhos e o país passe a apresentar reais níveis de crescimento.

O controle estatal sobre o sistema monetário é, sem sombra de dúvidas, um dos maiores males já vislumbrados na história. Após lograr êxito em acabar com o padrão-ouro, o Estado triunfou mais uma vez em sua cruzada para controlar cada aspecto da vida em sociedade: desde o controle social, passando pelo controle da liberdade individual, chegando ao total controle econômico e financeiro de cada indivíduo, interferindo diretamente em sua tomada de decisões e induzindo-o a agir da forma que meia dúzia de burocratas entende ser melhor. Anula e dilui por completo o senso de responsabilidade individual, fazendo com que cada pessoa nutra um desejo inconsciente de, cada vez mais, necessitar de amparo e benesses estatais, sem se dar conta de que isso significa mergulhar ainda mais em crises sem precedentes.

Enquanto se continuar remediando a doença com doses maiores de veneno, nada se pode fazer senão aguardar a morte precoce do paciente. Temos à nossa frente o desafio de enfim nos libertarmos ou continuarmos no caminho da escravidão voluntária, deixando nosso próprio futuro nas mãos de terceiros.

Ou aprendemos, de uma vez por todas, a sermos responsáveis financeira e economicamente, prezando por uma visão de longo prazo em vez de almejar resultados imediatos, ou continuamos a nos enganar voluntariamente ao acreditar que é possível usufruir de um melhor padrão de vida e consumo elevado sem, necessariamente, produzir ou trabalhar mais por isso, para logo em seguida termos de apertar os cintos e ver que, mais uma vez, tudo não passou de ilusão e que, na verdade, nos tornamos mais pobres do que nunca. A escolha é inteiramente nossa.

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